Disciplina - Biologia

Biologia & Ciências

13/11/2007

Pai da taxonomia

Há 300 anos nascia o naturalista sueco Carl von Linné (1707-1778). Conhecido como Lineu, foi responsável pelo sistema de nomenclatura e de classificação utilizado até hoje para organizar os seres vivos.

O Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP) comemorou a data, nos dias 8 e 9 de novembro, com um simpósio sobre o botânico e zoólogo que é considerado o pai da taxonomia moderna.

Para David Dunér, professor de história da ciência da Universidade de Lund, na Suécia, a razão do sucesso do sistema lineano é sua facilidade de aplicação. “Os sistemas utilizados antes dele eram difíceis de usar, por serem mais subjetivos. O caráter aritmético e geométrico de sua taxonomia foi uma revolução”, disse à Agência FAPESP.

Dunér, que também é membro da Swedish Linnaeus Society, em Upsala, explica que Lineu conseguiu estabelecer seu sistema com base na observação de milhares de espécimes vegetais e animais coletados por discípulos ao redor do planeta.

“Pelo menos 20 de seus discípulos viajaram por vários continentes. Um deles esteve com o explorador James Cook em sua primeira volta ao mundo e fez uma breve parada no Rio de Janeiro, em 1760”, contou.

Segundo Dunér, por trás do sistema lineano havia uma convicção de que a natureza não poderia ser um sistema caótico. “Ele tinha uma mente sistemática e queria ordenar e categorizar a natureza. Na sua concepção, as coisas precisam ter nomes para ser conhecidas”, disse.

Por trás da mente racional do cientista, havia um homem profundamente religioso. “Lineu via um princípio racional por trás da natureza. Para ele, como Deus não criaria o caos, então a natureza deveria ter uma ordem racional. A história natural teria a missão de sistematizar essa ordem natural”, afirmou.

Espécies invariáveis

A religiosidade de Lineu, filho de um pastor luterano, foi exatamente o que fez com que seu sistema precisasse ser revisto, como destacou Nelson Papavero, professor aposentado do Museu de Zoologia da USP, que também participou do simpósio.

O livro Species Plantarum, de 1753, no qual Lineu descreveu seu sistema, foi lançado 106 anos antes de Origem das espécies, em que Charles Darwin lançava as bases da teoria da evolução. Para Lineu, ao contrário do que prega o evolucionismo, as espécies eram invariáveis.

“O sistema dele é muito importante e é usado na prática até hoje. Mas surgiram novas teorias, principalmente a sistemática filogenética de Willi Hennig, que promoveu a grande revolução do século 20 na taxonomia”, disse Papavero à Agência FAPESP.

Segundo conta, os princípios de Hennig mudaram, pelo menos desde a década de 1970, a maneira de classificar os seres vivos. Para ele, os organismos devem ser classificados de acordo com as suas relações evolutivas. E o método para descobrir essas relações é analisar os caracteres ancestrais e os caracteres derivados de cada espécie.

“O sistema de Lineu é utilizado hoje para iniciar o processo de classificação dos seres vivos, mas em seguida os dados são reexaminados à luz da teoria da evolução e principalmente da sistemática filogenética, que transformou a taxonomia em ciência pela primeira vez”, explicou.

Papavero afirma que a revisão da taxonomia de Lineu deverá avançar com o tempo, em uma tentativa de conciliar sua classificação com os princípios evolutivos. “Há um problema de lógica nas categorias do sistema, que não considera a filogenia.”

Hennig defendia que os grupos de seres vivos só contivessem espécies monofiléticas – com a mesma origem. De acordo com Papavero, a proposta foi sendo introduzida ao longo do tempo, mas as categorias criadas por Lineu, sem nenhuma implicação evolutiva, continuam sendo usadas. “A revisão ainda vai prosseguir”, afirmou.

Quando foi lançado, o sistema de Lineu teve sucesso imediato, segundo Papavero. “Ele era extremamente político e sabia fazer lobby. Ficou especialmente famoso em 1735, quando fez o doutorado na Holanda e apresentou o primeiro manuscrito do Sistema naturae – um documento no formato de um jornal tablóide, com 11 páginas impressas. Sua descrição sobre os hábitos sexuais das plantas foi um escândalo em toda a Europa”, contou.

O sistema tinha efetivamente grandes méritos. Antes dele, o único método lógico para classificar uma espécie era o de unir todas as características que definissem sua classe. Com isso, uma roseira, por exemplo, era chamada de Rosa sylvestris alba cum rubore, folio glabro. “O próprio Lineu fazia isso em suas aulas: ficava meia hora falando os caracteres de uma planta em latim. Isso era incrivelmente antididático”, disse o professor aposentado da USP.

Com a ajuda da lógica aristotélica, Lineu introduziu a classificação binominal e criou as categorias. “Ele era profundamente aristotélico e soube aplicar a lógica na taxonomia. Além da base teórica, usou sua experiência em viagens pela Escandinávia e observou que os camponeses usavam nomenclatura binominal de forma intuitiva – como ocorre com os nomes populares em todos os lugares até hoje, por exemplo, barata de casa, barata de coqueiro, barata de praia”, explicou Paparevo.

Por Fábio de Castro

Agência FAPESP

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