Biologia & Ciências
05/11/2007
Células-tronco para a memória
Células-tronco neurais poderão ajudar a restaurar a memória de pessoas que sofreram danos cerebrais, indica pesquisa realizada na Universidade da Califórnia em Irvine (UCI), nos Estados Unidos.
No estudo, camundongos com danos cerebrais tiveram a memória restabelecida em níveis semelhantes aos encontrados em animais saudáveis, depois de receber tratamento com células-tronco por três meses. Os resultados do trabalho foram publicados na edição desta quarta-feira (31/10) da revista Journal of Neuroscience.
Segundo os autores, as células-tronco secretaram proteínas conhecidas como neurotrofinas, que protegeram da morte as células vulneráveis, resgatando a memória. O sucesso do experimento sugere que uma droga que aumente a produção dessas proteínas poderia ser desenvolvida para restaurar a capacidade de lembrar em pacientes com perda neuronal.
“Nosso trabalho fornece claras evidências de que as células-tronco podem reverter a perda de memória”, disse Frank LaFerla, professor de neurobiologia e comportamento da UCI. “Isso nos dá esperanças de que as células-tronco poderão, algum dia, ajudar a restaurar a função cerebral de humanos que sofram de uma ampla gama de doenças e danos que impedem a formação da memória.”
LaFerla, Mathew Blurton-Jones e Tritia Yamasaki fizeram seus experimentos utilizando um tipo de camundongo geneticamente modificado que desenvolve lesões cerebrais em áreas designadas pelos cientistas. Para esse estudo, eles destruíram células do hipocampo, área do cérebro vital para a formação da memória e na qual os neurônios morrem com freqüência.
Para testar a memória dos animais, os pesquisadores submeteram camundongos saudáveis e outros com danos cerebrais a testes de reconhecimento de objetos e lugares – memórias de lugar dependem do hipocampo, enquanto memórias de objetos dependem mais do córtex.
No teste de lugar, os camundongos saudáveis lembravam de seus ambientes em cerca de 70% dos casos, mas os animais com danos cerebrais só lembravam em 40% das vezes. No teste de objeto, os animais saudáveis lembravam dos objetos 80% das vezes, enquanto os doentes lembravam em apenas 65% dos casos.
Os cientistas então testaram se células-tronco neurais de um camundongo poderiam ajudar a melhorar a memória dos animais com danos cerebrais. Para testar a hipótese, injetaram em cada camundongo cerca de 200 mil células-tronco neurais desenhadas para aparecer coloridas de verde sob luz ultravioleta. A cor permitiu aos cientistas rastrear as células-tronco nos cérebros dos animais após o transplante.
Três meses depois do implante, os camundongos foram submetidos ao teste de reconhecimento de lugar. Os pesquisadores constataram que os animais com danos cerebrais que receberam o tratamento lembravam do ambiente em cerca de 70% das vezes – mesmo nível dos camundongos saudáveis. Os que não receberam o tratamento continuaram com limitações de memória.
Em seguida, a equipe examinou como as células-tronco coloridas de verde se comportavam no cérebro dos animais. Foi constatado que apenas 4% delas haviam se transformado em neurônios, indicando que as células-tronco não melhoravam a memória com uma simples substituição das células cerebrais mortas.
Nos camundongos saudáveis, as células migraram para o cérebro, mas nos animais com perda neural elas se acumularam no hipocampo, a área do dano. Os camundongos tratados com células-tronco apresentaram mais neurônios, quatro meses após o transplante, que os não tratados.
“Sabemos que muito poucas das células se tornaram neurônios. Então, achamos que as células-tronco estão melhorando o microambiente local do cérebro. As evidências sugerem que as células-tronco fornecem apoio aos neurônios vulneráveis e avariados, mantendo-os vivos e funcionais ao produzir as neurotrofinas”, disse disse Blurton-Jones.
Se as neurotrofinas suplementares estão de fato na base da melhora de memória, os cientistas podem tentar criar uma nova droga que estimule a produção dessas proteínas.
“Muito do foco na pesquisa com células-tronco tem relação com o fato de elas se transformarem em diferentes tecidos, mas talvez isso não seja sempre necessário. Nesse caso, não tivemos que produzir neurônios para melhorar a memória”, destacou Yamasaki.
O artigo de Frank LaFerla e outros pode ser lido por assinantes do Journal of Neuroscience em www.jneurosci.org.
Fonte: Agência FAPESP