Disciplina - Biologia

Biologia & Ciências

09/03/2010

Bactéria transgênica x Picada de aranha

A aranha-marrom (gênero Loxosceles) é pequena (cerca de 1 centímetro de comprimento) e pouco agressiva. Suas picadas ocorrem geralmente como forma de defesa, quando entram inadvertidamente em roupas ou calçados, por exemplo.
Apesar disso, ela está longe de ser inofensiva.
No ato da picada, na maioria das vezes não há dor. Mas depois de cerca de 12 horas ocorre um inchaço na região afetada e febre. Com o avanço, e sem tratamento, o veneno pode causar necrose do tecido atingido, falência renal e até mesmo morte.
De acordo com o Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) do Ministério da Saúde, em 2009 foram registrados 85.718 casos de acidentes com animais venenosos no Brasil, dos quais 17.474 com aranhas. Dos acidentes com aranhas, os casos envolvendo espécies de aranha-marrom responderam por um terço (5.728) do total.
O Butantan produz um soro para picadas de aranha-marrom, mas há considerável dificuldade para se obter o veneno usado na produção. "Como as aranhas são pequenas, o que se consegue de veneno é pouco. São necessárias centenas de exemplares para se produzir o soro", afirma Denise Vilarinho Tambourgi, diretora técnica do Laboratório de Imunoquímica do Instituto Butantan.
Mas pesquisadores do instituto acabam de dar um importante passo para tentar diminuir o problema, ao isolar o gene responsável pela fabricação da toxina esfingomielinase D, principal componente tóxico do veneno da aranha-marrom.
Estudos conduzidos desde 1997 no Butantan haviam conseguido avançar na decifração dos principais componentes do veneno e como ele atua no organismo infectado.
Agora, a equipe do Laboratório de Imunoquímica conseguiu inserir um gene da aranha em bactérias Escherichia coli, desenvolvendo um processo para a produção, em larga escala, da esfingomielinase D, por meio da bactéria - e não da própria aranha. A novidade poderá facilitar a produção do soro antiloxoscélico, empregado contra o veneno de aranha-marrom.
"Vários resultados mostram que o veneno da aranha-marrom tem um componente central, a esfingomileinase D, responsável pelos principais sintomas clínicos. Com base nisso, conseguimos isolar e introduzir o gene que codifica para essa toxina em bactéria. Para outros venenos, tal processo talvez não seja aplicável, uma vez que os venenos animais são, em geral, misturas complexas contendo várias toxinas, responsáveis pelos sintomas clínicos apresentados nos diferentes envenenamentos", disse Denise.
As três espécies de aranhas-marrons (L. gaucho, L. intermedia, L. laeta) estão bem adaptadas ao cenário intradomiciliar. A L. gaucho é mais comum em São Paulo, enquanto as outras duas ocorrem mais no Sul do país, no Paraná e em Santa Catarina, respectivamente.
Soro contra a picada de aranha
O soro produzido utilizando as esfingomielinases D obtidas por meio da E. coli é eficaz contra o veneno das três espécies.
Após isolar o gene responsável pela produção da toxina esfingomielinase D, os pesquisadores do Butantan inseriram anéis de DNA (plasmídeos) com o gene da aranha em bactérias Escherichia coli, que começaram a produzir a toxina.
A esfingomielinase D foi inicialmente administrada em camundongos e coelhos, para a produção de anticorpos que serviriam como matéria-prima do soro. Em seguida, os testes foram feitos em cavalos.
"Isolamos os anticorpos produzidos pelo animal para a produção do soro. Em seguida, comparamos esse soro experimental com o que se utiliza na terapêutica humana e vimos que tal soro era capaz de neutralizar o veneno total", disse Denise.
No novo processo as bactérias substituem as aranhas para a obtenção das toxinas. Os pesquisadores clonaram, na E. coli, os genes responsáveis pela toxina de duas das espécies de aranha-marrom: a L. intermedia, comum no Paraná, onde ocorre a maior parte dos acidentes no país, e a L. laeta, mais venenosa e presente em vários países latino-americanos.
Teste do soro em humanos
A próxima etapa da pesquisa é o teste do soro em humanos. Para isso, será necessário produzir três lotes consecutivos de soro antiloxoscélico. "Para a última fase, o ensaio clínico, precisaremos da autorização da Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária]. Nossa expectativa é que até o fim do ano esses três lotes de soro estejam prontos", disse.

Este conteúdo foi publicado em 08/03/2010 no sítio Diário da Saúde . Todas as modificações posteriores são de responsabilidade do autor original da matéria.
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