Biologia & Ciências
22/02/2016
Microprodutor de prata
Fungo é usado para produzir nanopartículas metálicas que podem ser empregadas como antibacterianosPor Evanildo da Silveira
Um estudo coordenado pelo professor Nelson Durán, do Instituto de Química da Universidade Estadual de Campinas (IQ-Unicamp), indica que o fungo Phoma glomerata é capaz de produzir nanopartículas de prata, que podem ser eficazes contra microrganismos. Trata-se de um esforço por novas drogas para debelar doenças causadas por fungos e bactérias. Para Dúran, nanopartículas antimicrobianas apresentam muitas vantagens em relação aos antibióticos convencionais, entre elas a redução dos efeitos colaterais.
“Levando em consideração a atividade antimicrobiana e os aspectos envolvidos na produção, como a utilização de meios de cultura de baixo custo, com bom rendimento e geração de resíduos não tóxicos, é possível que num futuro próximo as nanopartículas de prata possam ser utilizadas como medicamentos ou em combinação com antibióticos, visando potencializar sua ação”, diz a bióloga Marta Cristina Teixeira Duarte, do Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agrícolas (CPQBA) da Unicamp, que participou do estudo realizando os ensaios in vitro de atividade antifúngica com as nanopartículas. O uso inicial deve ser sobre a pele para tratamento de dermatomicoses. A ingestão de nanopartículas está descartada no momento por não se conhecer a toxicidade para os seres humanos.
No artigo publicado em 2015 na revista IET Nanobiotechnology, os autores, entre os quais Durán e Marta Cristina, sugerem que as nanopartículas de prata são uma nova esperança para o tratamento de infecções causadas por bactérias que se tornaram resistentes a antibióticos. Segundo Durán, a nanopartícula de prata tem uma superfície relativamente grande em comparação com o seu volume. Isso significa que a maior parte dos átomos está na superfície da nanopartícula, o que aumentaria sua eficiência antimicrobiana em razão de ter maior capacidade de interagir com outras substâncias. O uso do fungo Phoma spp. representa uma nova estratégia para substituir com vantagens os métodos físicos e químicos que empregam muitas vezes substâncias tóxicas ao meio ambiente.
Durán diz que, para superar esses obstáculos, os cientistas buscam inspiração na natureza e começam a utilizar cada vez mais os sistemas biológicos, como plantas, bactérias, algas e fungos, para fazer sínteses. As pesquisas mostraram até agora que os fungos têm a capacidade de reduzir cátions (íons com carga positiva) de metal para formar nanopartículas de tamanhos e propriedades diferentes.
O grupo de Durán optou pelos fungos por serem seres eucariotos (organismos ou células cujo núcleo está envolvido por uma membrana), o que lhes dá maior robustez e uma maquinaria biológica sofisticada. Além disso, seu cultivo é de fácil controle e há grande disponibilidade de linhagens ou cepas. Também pesaram na escolha as propriedades desses organismos em extrair metais do meio extracelular, que podem ser reduzidos ou oxidados pela remoção ou acréscimo de elétrons. “Nós propusemos o termo ‘miconanotecnologia’ para definir a área de pesquisa de síntese de nanomateriais por fungos”, diz Durán.
Protótipo eficiente
Além de Phoma spp., foi também estudado o fungo Fusarium oxysporum. “Os projetos procuraram verificar qual era o mais eficiente e econômico”, explica Durán. “Mas eles apresentaram desempenhos muito similares.” Com o primeiro foi comparada a eficiência de antibióticos existentes no mercado com a das nanopartículas de prata produzidas pelo microrganismo. Com o F. oxysporum, cuja pesquisa começou antes do Phoma, os trabalhos estão mais avançados.
A partir das nanopartículas produzidas com essa espécie foi desenvolvido um protótipo de antifúngico (gel e esmalte) contra onicomicose (infecção das unhas). “Agora, com apoio do Pipe [Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas] da FAPESP, vamos buscar a produção em maior escala, visando à utilização no tratamento de doenças negligenciadas e fúngicas de importância em humanos.” O novo medicamento está em estudos na empresa Donaire, de Americana (SP).
Durán conta que o trabalho foi iniciado em seu laboratório em 2013 pelo pesquisador indiano Mahendra Rai, da Universidade Amravati, que esteve no Brasil com apoio da FAPESP e também assina o artigo da IET Nanobiotechnology. O intercâmbio havia começado alguns anos antes, num projeto de parceria entre os dois países, financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). “Ele veio várias vezes para cá e eu o visitei algumas vezes em seu país”, conta. “O objetivo era gerar nanopartículas de prata biológicas para aplicações médicas e na agricultura. Como resultado, publicamos artigos sobre antibacterianos e antifúngicos e obtivemos patente no Brasil de um filme para a proteção de frutas.
Esta notícia foi publicada na Edição 240 de Fevereiro de 2016 da revista Pesquisa FAPESP. Todas as informações nela contida são de responsabilidade do autor.